Está aberta mais uma polémica no futebol português, depois do árbitro Fábio Veríssimo ter revelado, no relatório do jogo FC Porto – SC Braga, que durante o intervalo do jogo, foi surpreendido no seu balneário, com uma televisão, que não dava para desligar, a passar em loop, alguns imagens da primeira parte do jogo, nomeadamente esse momento em que a equipa de arbitragem anulou o golo de Froholdt, por uma suposta falta de Bednarek sobre o guarda-redes do SC Braga, Hornicek, na pequena-área, imediatamente antes do remate final.
O lance foi anulado por essa pretensa falta, imagem que estaria a passar, juntamente com imagens de um golo do Benfica contra o FC Porto, na final do Torneio da Pontinha, e arbitrado pelo próprio Veríssimo. Só que nesse jogo de março de 2024, o lance foi validado.
Entretanto, o Conselho de Disciplina da FPF avançou com um processo disciplinar contra o FC Porto, mas o que é que isto pode dar?
O advogado e professor de Direito do Desporto Lúcio Miguel Correia deu o seu parecer sobre o tema.
“É um comportamento atípico, completamente fora do âmbito daquilo que é o normal num jogo. Já agora, dizer que não é assim que a nossa Liga vai ser vendida no estrangeiro. Algo inconcebível em Inglaterra ou Espanha”, começou por dizer o especialista jurídico, antes de assumir, no entanto, que tudo isto tem um enquadramento legal difícil.
“O problema é do ponto de vista jurídico, por muito obtuso ou muito ridículo que seja esse comportamento, não o consigo enquadrar devidamente no regulamento disciplinar, por muito que seja censurável. A questão da coação significa um ato de violência física ou moral sobre um árbitro, um jogador, etc., mas esta coação, que além de significar aqui violência física ou moral, tem que, obviamente, condicionar o próprio desempenho desportivo do árbitro e isso não aconteceu. O árbitro continuou o seu trabalho, não houve violência física, ninguém arrastou o árbitro campo fora, e não há verdadeiramente assédio, no sentido em que foi cometido um crime.
Há aqui uma dificuldade jurídica de enquadramento, face àquilo que são os ilícitos disciplinares previstos nas normas do regulamento. Quando temos um conjunto de comportamentos que são, de facto, no meu ver, inqualificáveis, que nem sequer deveriam existir, temos de os enquadrar do ponto de vista disciplinar. Acho que ameaça não há, porque imagens em ‘loop’ não significa uma ameaça, um ato hostil também, verdadeiramente, não fica aqui enquadrado. Esse caso não cabe no artigo 66.º, porque não houve violência física nem moral no sentido de o árbitro não ter conseguido acabar o jogo.
Em sede de inquérito serão ouvidos a FC Porto SAD, o delegado, o próprio árbitro, e temos de perceber se houve ou não houve efeitos no seu desempenho desportivo e qual foi a verdadeira intenção de quem lá pôs aquelas imagens em ‘loop’ e quem escondeu o comando da televisão”, contextualizou o jurista.
Sobre a possível perda de pontos para o FC Porto e, inclusive, uma desclassificação, Lúcio Correia não vê isso como provável.
“Não, de todo. Não há um relato de que o resultado só foi obtido em virtude daquelas imagens, e que isso condicionou e, eventualmente, provocou que o árbitro tivesse tido um desempenho desportivo muito aquém, ou até contrário àquilo que costuma ter. Não me parece que haja aqui um nexo de casualidade entre o resultado, o desempenho desportivo e a exibição daquelas imagens, que, volto a dizer, são completamente antiéticas e altamente reprováveis. Portanto, nesse aspeto, não me parece. Admito que possa haver aqui uma multa, admito que possa haver, eventualmente, até outro tipo de sanções, mas uma sanção da derrota parece-me completamente fora do contexto”, disse o especialista.
Discussion about this post